As obviedades do Dia

Pense no dia de hoje,
Seja ele recente, na madrugada,
Seja ele chegando ao fim, na noite fria e enluarada.

Pense...

Nos hábitos e nos vícios,
Nos sinais e nos indícios.

Pense na forma como pensava pela manhã;
Pense na forma como pensa, enquanto pensa;

Pense nos pesares,
Pense nos olhares,
Na distância do passado que aconteceu,
até ontem,
até hoje, antes... e talvez Agora.

Pense...
Que dia diferente.

A água que não veio ao ligar a torneira,
A porta que não trancou com o girar da chave.
O tropeço irrelevante no tapete,
O correr para fugir da chuva em meio a ladeira.

Pense...

Da solidão do acordar, a multidão do transitar.
Da atrofia dos sentidos, ao contato imediato com os conflitos.
Da confusão ao começar a pensar, a execução dos ritos.

Que dia diferente, realmente.

Mas, enfim...
Eu penso:

Penso que mesmo sobre a cama, imóvel, eu abro portas.
Penso que ao sentar-me a beirada, apenas respirando, eu abro portas.
Penso que devo abrir todas as portas que eu puder...

Cada passo que damos cruzando as portas já abertas,
Não nos ensinam,
Nem fortalecem.

Se usarmos apenas as pernas,
Durante muito tempo,
Não saberemos mais usar as mãos para abri-las.

Precisamos abrir novas portas.
Precisamos bater, tocar campainhas... Talvez força-las.

Mas, precisamos...

Precisamos da porta que nos leve para o horizonte,
Que nos mostre algo que materialize a esperança,
Que deixe que ela nos confronte,
E acenda a nossa chama da mudança.